TV argentina tira comercial do ar após pressão russa e LGBT

TV argentina tira comercial do ar após pressão russa e LGBT

Quem acompanha as publicidades argentinas durante as Copas
do Mundo sabe que elas exageram no tom épico, poético e que abusam da auto
ironia. Desta vez, a emissora esportiva TyC Sports talvez tenha ido um pouco
além da conta ao tocar numa questão delicada, a homossexualidade, ainda um tabu
nas terras do líder russo Vladimir Putin.

O “spot” diz que, na Argentina, pode parecer estranho para ele,
Putin, que “homens chorem por outros homens”, “que se abracem e
rolem na grama juntos”, “que coloquem seus genitais nas nucas dos companheiros”
(ao celebrar um gol ou um título), ou que, ainda, “saiam correndo sem
roupa para abraçar seus ídolos”. Todas essas declarações são ilustradas
por reações dos jogadores no campo e nos vestiários que as ilustram.

E a mensagem final diz:
“Se para o senhor o amor entre homens é uma doença, estamos muito doentes.
E avisamos. É contagioso.”
Os russos reclamaram por meio
de uma carta enviada pela Embaixada Russa em Buenos Aires ao diretor de
programação do canal, Pedro Freire. A carta do embaixador russo dizia: “Me
permito expressar profunda surpresa e repúdio por essa produção de qualidade
duvidosa e a mensagem confusa que transmite, assim como o uso não autorizado da
imagem do presidente da Federação da Rússia (Vladimir Putin) para fins comerciais.”
Freire, porém, afirma ter
tirado não apenas por causa de Putin mas porque também recebeu pressão de
alguns grupos de direitos dos homossexuais e da comunidade LGBT que se sentiram
ofendidos por alguns termos e piadas.
A Argentina foi o primeiro
país da América Latina a legalizar o matrimônio homossexual, em 2010. E, em
2012, aprovou a lei de identidade de gênero –ou seja, permitindo a troca
de identidade e a cirurgia para mudar de sexo financiada pelo sistema público
de saúde.
“Somos uma sociedade
mais permissiva, e muito conhecida pela auto ironia. É por isso que me parece
desbalanceado ofender-se com coisas que aparecem no spot, me parece que foi uma
coisa de uma minoria que levou tudo muito ao pé da letra. O bom de estarmos no
estágio em que estamos, tendo avançado muito, deveria ser que pudéssemos rir
disso. E os argentinos sempre foram bons em rir de si mesmos”, diz por
telefone o jornalista argentino Bruno Bimbi, do canal TN e autor de “El
Fin del Armário” e outras publicações sobre homossexualismo.
Já o jornalista esportivo
Ezequiel Fernandes Moores, o mais respeitado em seu país, colunista do “La
Nación”, respondeu por e-mail desde a Rússia: “a intenção não era má.
O TyC já tinha feito um que tirava sarro da política migratória de Trump quando
a Copa América foi realizada nos EUA. O que falhou neste não foi a ironia com
Putin, mas que, de tão relaxado, acabou reproduzindo algumas piadas
consideradas homofobias que ainda produzem dor a muita gente. O TyC tirou do ar
por conta de uma queixa da Rússia, mas se fosse eu, teria tirado pela
brincadeira com os estereótipos gays. Estes podem ter se transformado em piada
e isso é um sinal de amadurecimento da sociedade, mas ainda causam dor a
muitos.”
Moores tem a importância no
jornalismo esportivo argentino comparável a de Juca Kfouri no Brasil.
“A Copa promove esse
tipo de encontros de culturas que causam esses curto-circuito, não? No Brasil,
é raríssimo que um homem beije outro homem, é visto como algo supostamente gay.
Por outro lado, os brasileiros se abraçam e se tocam demais no dia a dia, algo
que os argentinos estranham muito. Além disso, os jogadores brasileiros rezam,
dedicam tudo a Deus, o jogador argentino não faz isso”, diz Bimbi.
E completa: “como alguém
que estuda o tema (a homossexualidade), não vejo ofensa na publicidade, que
além de tudo é inteligente, engraçada e bem feita. Não é por uma publicidade
jocosa que tem de passar a luta por reconhecimento dos direitos dessas
minorias.”

Até a tarde desta
quarta-feira (13), o “spot” já tinha mais de 145 mil visualizações no
Youtube. Com
informações da Folhapress.


Pega Visão

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