Caçadores que descobriram cratera em Vera Cruz foram ‘salvos’ por cão desconfiado

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Vista aérea da cratera aberta em Matarandiba, em Vera Cruz
A dupla não imaginava, no entanto, que esbarraria com uma cavidade, digamos, bem maior do que aquelas em que os tatus costumam se esconder. Buraco, não, cratera com mais de 40 metros de profundidade, aberta em meio ao resquício de mata atlântica que beira a costa do povoado.Dois caçadores se embrearam no mato na madrugada do último dia 3 no povoado de Matarandiba, uma ilhota que pertence ao município de Vera Cruz, bem ao lado da Ilha de Itaparica. Estavam em busca de animais, em especial tatus, bichos ligeiros e discretos que costumam se esconder em buracos.
O buracão no meio do mato fica em uma área de exploração da empresa internacional Dow Química, responsável pela extração do sal em Matarandiba. Além de mais da profundidade, a fenda possui uma extensão superficial de 69×29 metros.
Voltando dois dias na história, na madrugada do dia 1°, os caçadores, que estavam na companhia de um cachorro, precisavam estar com a audição apurada. É preciso, nessas horas, estar em silêncio para descobrir onde a caça mora. O silêncio, contudo, foi quebrado por um forte estrondo que ecoou mata adentro.
O cachorro, bicho cismado, após o barulho, relutou em dar um passo à frente, mesmo com a insistência dos donos. O animal parecia saber que caminhar por mais alguns metros seria arriscado demais. E era.
Bom, os caçadores decidiram recuar respeitando a intuição do cholinho, mas decididos a voltar no dia seguinte para descobrir de onde veio o forte barulho. À luz do dia, a surpresa: algo nunca antes visto na história do povoado de aproximadamente 900 habitantes, que é formado, em sua grande maioria, por marisqueiras e pescadores.
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Não demorou muito para o espanto se espalhar por toda a região. A príncipio, os caçadores disseram que aquela cratera tinha o tamanho correspondente a três campos de futebol. Comentário suficiente para deixar boa parte da população em pânico. Técnicos da empresa, no entanto, verificaram, depois de uma inspenção, que o tamanho da cavidade equivale a 1/3 de um campo.
Embora os moradores tenham tomado conhecimento do ocorrido no dia 3 de maio, a empresa já estava sabendo do sedimento desde o dia 30 de maio, logo após um técnico avistar o local durante a manutenção do espaço.
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Ilhota que pertence a Vera Cruz fica bem ao lado da Ilha de Itaparica
Atualmente, a empresa possui seis poços perfurados que servem para extrair a salmora que, mais tarde, é transformada em sal. Mas há 40 poços já desativados pela empresa; inclusive, um fica a cerca de 200 metros de onde surgiu a cratera.Exploração do solo
Os mais velhos temem que a ilha venha abaixo ou se divida em duas; outros estão preocupados que a fenda cresça a ponto de chegar até a comunidade, mesmo o buraco estando localizado a cerca de 1 km de lá. Há também aqueles que estão convictos que se trata de um fenômeno natural ou um evento que aconteceu como consequência da exploração do solo da ilha ao longo de 40 anos pela Dow.
A marisqueira aposentada Ivone Pereira, 71 anos, não precisou sair do varandado de casa, onde costuma repousar depois do almoço, para saber que a cratera tinha surgido em Matarandiba. No povoado, a notícia correu rápido, “assim como os mexiricos”, brinca Ivone. E um evento daquele porte – e profundidade – não demoraria a se espalhar, claro.
“O povo comenta aí, mas eu não sei direito, não. Não vi e não sei, mas o pessoal sabe. Mas eu pedi a Deus proteção. Sim, claro ficamos amendrotados, né? Se a ilha se dividir, quero ficar aqui, onde eu moro há 71 anos”, diz Ivone.
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Dona Ivone Pereira vive no povoado há 71 anos e nunca esteve tão preocupada
Os curiosos se reuniram em volta da cratera para olhar, com os próprios olhos, o boato que corria pelas ruas do povoado. É o caso do pescador Altamiro Gonçalves, 54, que esteve bem próximo para fazer um registro da fenda pelo celular. O alívio só veio depois que, no rádio, um locutor local pediu calma à população, informando-os que, embora de grandes proporções, o buraco não corria o risco de se alargar a ponto de chegar à comunidade, se tratando apenas de um “fenômeno natural”. Muitos moradores, no entanto, continuam duvidando.